FRANCISCO, O SURPREENDENTE
HOMEM D0 ANO
PERSONALIDADE DO ANO DE 2013
Em
19 de dezembro de 2013 completaram-se nove meses do Papado de Francisco, que eu
denominei no título dessa postagem como “o surpreendente”!
Hajam
surpresas!
EM 10 DE JULHO DE 2013 é
noticiado que o Papa Francisco foi eleito pela revista “VANITY FAIR” da Itália
como o “HOMEM DO ANO” dedicando a ele a capa da sua edição.
A
foto do Papa sorridente é acompanhada pelo título ”FRANCISCO PAPA CORAGEM” e cita sua denúncia sobre os imigrantes
que tentam atravessar o mar Mediterrâneo, mesmo diante de todos os riscos.
“Quem de vocês chorou pela morte desses irmãos ou irmãs?”
Segundo
a Vanity Fair, durante a sua visita de 8 de julho,uma segunda-feira, a Lampedusa,
o Papa quis ilustrar com palavras “pesadas como pedras” o que ele diz aos
padres quando os aconselha a serem pastores.
“Os
cem primeiros dias de seu pontificado já o colocaram entre os principais
líderes mundiais”, considerou a revista, acrescentando que “a revolução
continua”.
EM 11 DE DEZEMBRO DE 2013, a
revista americana “TIME” elege o Papa Francisco como a “PERSONALIDADE DO ANO”
de 2013.
Justificando
a escolha a revista escreve que “o que torna esta Papa tão importante não é a
rapidez com que cativou milhões que tinham desistido de ter esperança na
Igreja. [...] Em escassos meses, Francisco elevou a missão de reconfortar da
igreja – a missão de servir e confortar os que mais precisam – acima da
doutrina política que fora tão importante para os seus antecessores. Com seu
estilo modesto e próximo das pessoas, ele fez soprar ventos de mudança numa
Igreja católica em crise”.
A
Time disse que Francisco “tirou o papado do palácio para levá-lo às ruas” e se
colocou no centro das discussões chaves da época”.
“Em
nove meses, ele soube colocar-se no centro das discussões essenciais da nossa
época: a riqueza e a pobreza, a equidade e a justiça, a transparência, a
modernidade, a globalização, o papel da mulher, a natureza do casamento, as
tentações do poder”, resumiu Nancy Gibgs. A revista americana destacou o papel
do ex-arcebispo de Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio para comprometer uma
Igreja que tem 1.2 bilhão de fiéis no mundo a “enfrentar as necessidades mais
profundas e equilibrar seu julgamento com piedade”.
O
porta-voz da Santa Sé, o padre Francisco Lombardi, afirmou que “o Papa não busca a fama e o sucesso porque
está ao serviço do evangelho de Deus, de amor para todos. Se a escolha como
personalidade do ano significa que as pessoas entenderam, ao menos
implicitamente, esta mensagem, então o deixará definitivamente feliz”.
Também em DEZEMBRO DE 2013,
Jorge Bergoglio é capa da prestigiosa revista estadunidense “THE NEW YORKER”,
com uma ilustração particular.
A
edição de dezembro da mítica revista nova-iorquina inclui um extenso e muito
elogioso artigo sobre Francisco, no qual qualifica
seu primeiro ano à frente da Igreja católica como “radical”.
“O
Papa Francisco parece ser um bom companheiro – uma pessoa boa – e um sincero defensor da boa vontade e da paz
na Terra. Mas quem sou eu para julgar?”, disse Barry Blitt, o artista
encarregado da ilustração, denominada “Snow
Angel”. É dessa maneira que se chama, nos Estados Unidos, a figura que fica
marcada na neve quando uma pessoa deita sobre ela e move seus braços até formar
“asas de anjo”.
“Quem sou eu
para julgar?” é, de fato, o título do extenso perfil sobe Francisco
escrito por James Carrol para a próxima edição. Com essas cinco palavras,
pronunciadas no final de julho em resposta à pergunta de um jornalista sobre o
estado os sacerdotes homossexuais na Igreja, o Papa Francisco afastou-se do tom
de reprovação, da moralização explícita típica dos papas e dos bispos. Este
gesto de abertura, que surpreendeu o mundo católico, demonstraria não ser um
fato isolado”, escreve James Carrol, autor da nota.
Voltando um pouco atrás, em
20 de junho, transcorridos os primeiros cem dias desde a sua eleição, não
faltavam análises que tentavam traçar um primeiro perfil do pontificado de
Francisco.
Um fato já sinalizava de forma evidente que havia algo de novo.
Um fato já sinalizava de forma evidente que havia algo de novo.
EM 22 DE JUNHO – AUSÊNCIA DE
FRANCISCO NO CONCERTO DO VATICANO DEDICADO AO ANO DA FÉ
Em
22 de junho, realizou-se um grande concerto de música clássica no Vaticano dedicado ao Ano da Fé. O concerto seria em honra do novo Papa.
No entanto, a poltrona reservada a Francisco permaneceu vazia. Durante toda a
tarde daquele sábado, Francisco não saiu de sua habitação em Santa Marta e
disse aos seus colaboradores com simplicidade: “Não sou um príncipe do Renascimento que escuta música em lugar de
trabalhar”. E continuou ocupando-se das tarefas que julgava urgentes e
improrrogáveis.
Francisco pôs em marcha uma revolução, que representava um enigma. Ele deixava claro que não ia mais para o apartamento do Palácio Apostólico, no Vaticano. Rejeitava-o abertamente. Assim como rejeitava os grilhões de agendas pré-estabelecidas. A decisão foi e continua sendo tão inédita e chocante! Os conservadores escandalizados tentaram minimizar a importância do gesto como apenas de “estilo pessoal” ou toque de originalidade. No entanto, é como se Obama deixasse a Casa Branca, ou a rainha da Inglaterra saísse do Palácio de Buckinghan!
Bergoglio desvaloriza radicalmente o
Palácio, exalta o verdadeiro chefe da Igreja – Cristo - e se coloca abertamente
entre os “pecadores” como são os fiéis aos quais ele se dirige.
A
partir de sua eleição e posse, cada gesto e cada palavra de Francisco foram
sopesados quase obsessivamente para responder a uma mesma pergunta: “Ele é um
conservador ou um progressista?” Esse esquema dualista demonstra uma ruptura
profunda que divide a Igreja interiormente há décadas provocando confrontos que
desmentem a fraternidade cristã e paralisam a Igreja.
O Papa Francisco aos poucos vai
realizando, com gesto e palavras, uma reconfiguração linguística dentro da
Igreja que põe em relevo ênfases e prioridades novos.
Os
símbolos contam muito. Dia após dia o papa que veio do fim do mundo desmontou a simbologia imperial e quase
divina dos pontífices. Ele rejeitou o manto e os sapatos púrpuras dos
imperadores romanos, eliminou as mitras triunfalistas, ficou na chuva com os
fiéis, explicou que viver isolado como soberano não lhe é possível por “motivos
psiquiátricos”, como se dissesse que é coisa de anormais se encerrar em uma
torre de marfim.
O Palácio vazio, redimensionado como
sede de trabalho, expressa uma reviravolta epocal. Francisco
provoca inquietações dentro e fora da Cúria Romana. Despedaça o ícone
ideológico da “sede apostólica” como centro de um poder de cunho divino. Impede
que a burocracia vaticana se cubra de pretensões de infabilidade. Reforça o
pedido aos bispos do mundo para que não adoeçam com a “psicologia de
príncipes”.
Bento
XVI, abdicando, humanizou o papel papal. Francisco tira suas consequências,
apresenta-se somente como “bispo de Roma” e arquiva a sua aura onipotente de
pontífice Máximo. É o primeiro papa que
descarta a ideologia da onipotência.
MARCO
POLITI, em 23-06-2013, no jornal Il Fatto Quotidiano lançava
a pergunta: “ Bergoglio conseguirá dar um salto à frente ? Transferir padres na diocese de Buenos Aires do centro para as
favelas era bastante fácil. O exemplo pessoal já contava muito. Mas aqui se
trata de colocar em trilhos novos o
imenso corpo de uma igreja, dirigida por centenas de milhares de quadros, varrendo carreirismo, corrupção e
obediências de conveniência.
Reformar a Igreja Católica,
habituar bispos a serem missionários sóbrios no estilo de vida e não potentados
locais, reprogramar o pessoal Vaticano e o clero a um trabalho essencialmente
pastoral e não de funcionários mais ou menos sistematizados, tirar da Cúria o
papel milenar de centro burocrático e de poder incontestável, fazendo dela um
instrumento de unidade em espírito de colaboração com os episcopados do
mundo... É um objetivo gigantesco.
O JORNALISTA
JESUÍTA PEDRO MIGUEL LAMET, em artigo publicado no seu blog “El
alegre cansancio”, em 20-06-2013 diz que Francisco
“dá seus primeiros passos para se levar à sério o quase desprezado Vaticano II,
em sua concepção de colegialidade. O mais significativo deles é, sem
dúvida, a eleição do Conselho de Cardeais para o espinhoso
tema da corrupção, e que parece que poderia se institucionalizar numa forma
permanente de assessoramento papal ou em um governos colegiado.
Em
seu pensamento, o Papa Francisco está se
manifestando como um grande comunicador, que coloca o acento no positivo ao
invés da condenação sistemática dos males do mundo. Sem dúvida, tem
açoitado a guerra, o desprezo à vida, o esvaziamento da sociedade de consumo, o
egoísmo imperante, mas sem vacilar contra o atual império das finanças, o
flagelo do desemprego e a exploração dos pobres, sua principal preocupação.
Há
alguns meses, seria incompreensível ouvir de um papa palavras como as dirigidas aos religiosos da América Latina: “É
possível que recebam uma carta da Congregação da Fé, mas não se preocupem e
continuem adiante, denunciando os abusos. Abram portas, façam algo onde a vida
clama. Prefiro uma Igreja que erre por
fazer algo, do que uma que adoeça por ficar fechada.”
O
PRESIDENTE DA CONFERÊNCIA JESUÍTA, PADRE THOMAS H. SMOLICH, falou
em 20-06-2013 sobre suas primeiras impressões sobre o Papa Francisco:
“Francisco entende que grande parte de seu
poder como papa é simbólico: ele lidera pelo exemplo, pela profundidade de sua
paixão. Seu estilo de improviso pode provocar espasmos nas autoridades do
Vaticano, mas ele lhe permite se conectar com as pessoas de todo o mundo. Na
era do twitter, ele está provando ser hábil com frases incisivas: “Os pastores
devem ter o cheiro de suas ovelhas” é a minha preferida, mas eu também gosto da
sua afirmação de que perder o contato direto com os pobres leva ao
“aburguesamento do coração”.
HENRI
TINCQ, JORNALISTA ESPECIALIZADO EM ASSUNTOS DO VATICANO comenta
por ocasião dos cem dias desde a eleição do papa que “uma minirrevolução está sacudindo a Igreja Católica – e o seu bilhão de
fiéis.
O Papa Francisco se libertou do
arrocho da Cúria Romana – o aparato de governo da Igreja – da
qual Bento XVI era refém. Fez a escolha simbólica fundamental de não mais
residir nos apartamentos privativos do palácio pontifício, que considera
sinistros, separados do mundo exterior, demasiado próximos da Cúria, e de
refugiar-se em Santa Marta – no interior da cidade do Vaticano onde residem os
visitantes religiosos e cardeais durante o conclave. Assim a Cúria não pode aprisioná-lo, nem decidir para ele o programa
dos seus encontros, nem filtrar as informações que lhe chegam. Jovial,
espontâneo este papa latino- americano necessita de contatos humanos, enquanto
seu predecessor governava de maneira solitária.
A
montanha de gestos e palavras é surpreendente, mas já se pode entrever aonde vai este pontificado: para a defesa de um
cristianismo social voltado à pureza das origens, autêntico nas suas
convicções, empenhado pelos mais débeis e os excluídos (“Uma igreja de pobres
para os pobres”).
VICTOR
MANUEL FERNÁNDEZ, PRESIDENTE DA SOCIEDADE ARGENTINA DE TEOLOGIA E DOUTOR EM TEOLOGIA,
em artigo publicado na revista argentina Vida Pastoral faz algumas
considerações à respeito de Francisco.
Destaco
aquelas que justificam Francisco como o Papa Surpreendente.
Bergoglio é um homem do Concílio
Vaticano II. Devemos
dizer com toda a clareza que sempre
defendeu uma igreja missionária e servidora, não centrada em si mesma, mas a
serviço das pessoas. Mostra uma Igreja despojada e a caminho. Cansou-se de
pedir aos sacerdotes que estivessem disponíveis para o povo, que se mantivessem
abertos à escuta e ao diálogo, que não fossem juízes implacáveis, que fossem às
periferias e que se ocupassem dos “descartáveis” da sociedade.
A palavra “povo” é uma das que
Bergoglio usa com brilho nos olhos. Avalia o povo como sujeito coletivo, que
deveria estar no centro das preocupações da Igreja e de qualquer poder.
Não é pouca coisa dizer isto, quando em alguns setores da sociedade e da Igreja
o povo é considerado apenas como uma massa cheia de defeitos que devem ser
sanados pela ação educativa dos “sábios e prudentes”.
Como
bispo, Bergoglio sempre insistia em que os padres não apenas fossem
misericordiosos, mas também soubessem se adaptar às pessoas, que não
mantivessem nem uma moral nem práticas eclesiais rígidas, que não complicassem
a vida das pessoas com normas baixadas autoritariamente de cima para baixo. “Nós existimos para dar ao povo o que o
povo necessita” é uma convicção que expressou insistentemente.
Sua
preferência pelos pobres não é de hoje. O
pobre não é só objeto de um discurso, nem sequer de uma mera assistência, e
tampouco exclusivamente de uma “promoção” que o liberte de seus males.
A opção pelos pobres é tudo isso, mas mais do que isso. Porque é cuidar, tratá-los como pessoas que pensam, tem seus próprios projetos, e inclusive o direito de expressar a fé ao seu modo. São sujeitos, ativos e criativos a partir de sua própria cultura, não apenas objetos de um discurso, um pensamento ou uma ação pastoral.
A opção pelos pobres é tudo isso, mas mais do que isso. Porque é cuidar, tratá-los como pessoas que pensam, tem seus próprios projetos, e inclusive o direito de expressar a fé ao seu modo. São sujeitos, ativos e criativos a partir de sua própria cultura, não apenas objetos de um discurso, um pensamento ou uma ação pastoral.
Sua pobreza pessoal não é oportunista
nem midiática. Todos
sabem que sempre foi assim. Austero até o sacrifício. Quando se tem
responsabilidades importantes, trata-se de usar os meios que lhe permitam
otimizar o aproveitamento do tempo.
Bergoglio é coerente com sua sentida opção por uma vida pobre. Nunca se sentiu digno de ser servido, e são conhecidos seus gestos de serviço simples, evitando mostrar-se como superior. Parece difícil que ele possa suportar por muito tempo os modismos palacianos, alguns ritos e formalidades que ele detesta, porque não refletem a simplicidade do Evangelho de Jesus.
Bergoglio é coerente com sua sentida opção por uma vida pobre. Nunca se sentiu digno de ser servido, e são conhecidos seus gestos de serviço simples, evitando mostrar-se como superior. Parece difícil que ele possa suportar por muito tempo os modismos palacianos, alguns ritos e formalidades que ele detesta, porque não refletem a simplicidade do Evangelho de Jesus.
08-julho-2013
PRIMEIRA VIAGEM DO PAPA FRANCISCO - ILHA DE LAMPEDUSA –
A ILHA DOS SEM PARADEIRO
Lampedusa
é uma ilha italiana que fica mais próxima da Tunísia do que da Sicília e uma
vez que sua distância da costa do norte da África não ultrapassa em muito os
100 km, tornou-se rota de passagem para a Europa, principalmente de pessoas
refugiadas.
Provenientes
de áreas de conflito, com a vida em risco em seus países de origem,
especialmente pelas guerras e pela fome, homens, mulheres e crianças acabam não
tendo outra opção a não ser partir de suas terras. Assim, arriscam-se em
embarcações precárias rumo a melhores condições de vida. São muitos os que
padecem no mar. Fala-se em 20 mil mortos
no mar e de aproximadamente 200 mil pessoas que já passaram pela ilha.
Esta
é uma trágica situação que diz respeito a todos. Um tema que escancara plenamente a indiferença e a morosidade dos
países em relação aos dramas humanitários vivenciados por estas pessoas, além
de significar um esfacelamento total da solidariedade entre os povos.
Na
maioria dos países, nega-se sistematicamente a garantia de direitos para os
homens e mulheres que tiveram que abandonar suas terras. Laura Boldini,
presidente da Câmara de Deputados italiana, tem a opinião de que “é um
anacronismo perigoso o fato de uma lei sobre a cidadania italiana não reconheça
que na Itália vivem quatro milhões de imigrantes aos quais os direitos civis
são negados”.
O CONVITE QUE LEVA FRANCISCO À LAMPEDUSA
Ainda
no mês de março, Francisco que também é “um filho da imigração”, recebeu uma
carta de Stefano Nastasi, pároco em Lampedusa, convidando-o para conhecer a
ilha.
Com uma linguagem tocante Nastsi escreveu:
”As lágrimas que marcam os rostos das pessoas resgatadas do mar falam de
sol e de sal, de arrepios e de fome”.
Em seguida, desferiu as palavras que
não poderiam deixar de despertar o que no coração do Papa parece ser abundante,
a compaixão:
”Eu gostaria de pensar que
as lágrimas dos seus olhos, que fluíram no momento da sua eleição, poderiam se
encontrar com as lágrimas de todo homem e de toda mulher que sofrem nos quatro
cantos do mundo”.
Lampedusa que muitos preferiam
ocultar, fazer de conta que não existe, tornou-se um ponto de partida para
Francisco.
A visita do Papa não nasce de um
acordo entre autoridades, mas, sim, da gritante situação dos refugiados da ilha
que, em meados de junho, protagonizaram mais um naufrágio entre tantos na
história desta rota de passagem. Neste sentido, trata-se de um gesto em favor dos imigrantes e refugiados. Como bem
destacou o vaticanista Giacomo Galeazzi “o pontificado itinerante de Francisco
começa onde a sua ‘igreja pobre para os pobres’ experimenta cotidianamente a
fronteira do desconforto”.
Em mais um atitude surpreendente, o
Papa dispensou a presença de autoridades políticas.
Quis dar ao encontro com os pequeninos de Lampedusa um caráter discreto,
particular. Não foi à ilha como um chefe
de Estado, mas como um companheiro das vítimas da indiferença. Apenas a
prefeita Giusi Nicolini, o pároco e o bispo de Agrigento, dom Francesco
Montenegro, forma os que o acompanharam. É o caráter pastoral da breve visita
do Pontífice a uma das mais dramática ‘periferias existenciais’, onde muitas
vezes a humanidade é ofendida, que exclui o encontro com políticos e com as
autoridades, mesmo as religiosas. Ele só
quis humildes pescadores e gente de Lampedusa.
Esta
viagem evidenciou que a força de
Francisco está em sua opção pelos que nada possuem de força, nem econômica, nem
política, nem de direitos básicos. São os recriminados da terra.
SÍMBOLOS QUE FALAM POR SI
Desde
os primeiros gestos como Pontífice, Francisco não parou de recorrer ao
simbólico. A viagem a Lampedusa –
considerada “a ilha dos desesperados e dos últimos” ou “o inferno do
Mediterrâneo” – é em si mesma simbólica.
Perdida no meio do mar, sem
representar nenhuma potência econômica ou política, considerada um cemitério de náufragos ou um refúgio de
sobreviventes, essa ilha foi a razão da primeira viagem do papa Francisco.
As poucas horas que a viagem durou foram marcadas por gestos simbólicos e
palavras, com o potencial de prolongar e fazer ecoar essa viagem.
A
chegada a ilha foi simples. Logo pegou uma embarcação e no meio da viagem pediu
para parar. Tomou nas mãos uma coroa de crisântemos amarelos e, em profundo silêncio
de oração, jogou-a ao mar – essas mesmas águas que já tragaram milhares e
milhares de vidas humanas.
No
campo esportivo, centenas de pessoas o aguardam para a missa. As primeiras fileiras são ocupadas não
pelas autoridades, que caso queiram participar, precisam mistura-se aos fiéis,
mas por migrantes, deficientes e
crianças. O tom é penitencial, dado pelas vestimentas roxas e confirmado
pelas palavras do Papa e por sua postura recolhida e de cabeça baixa.
A
revolução que o Papa Francisco está fazendo na liturgia não se detém na assembléia.
Ela sobe ao centro do espaço litúrgico. O altar e o ambão são feitos de madeira
de restos de embarcações que naufragaram; o cálice, também de madeira, ostenta
um enorme cravo, que lembra os crucificados de ontem e de hoje e em muitas
circunstâncias; um timão enfeita a frente do altar.
O
motivo está claro: tornar visíveis os sofrimentos de milhares de imigrantes que
perdem suas vidas no mar em embarcações superlotadas ou mesmo escondidos em
gaiolas, na esperança de aportarem em terras menos inóspitas e mais
hospitaleiras. Que revolução quando comparado com a pompa, a extravagância e o
rigor dos rituais, de pontificados anteriores!
O cálice de madeira usado durante a missa – com o grande prego atrás da base, memória da paixão de Cristo – é o símbolo visível da revolução do pontificado de Francisco.
A Igreja, como ele a entende, da forma como ele a faz entrever em Lampedusa, e como espera remodelá-la, é assim. Sóbria, “pobre e para os pobres”, uma Igreja para todos e não apenas para o rebanho dos fiéis, estendida para os desventurados, muito concreta para mostrar ao mundo o que está errado e em apontar as responsabilidades dos maiores poderes político-financeiros que preferem se entrincheirar no anonimato.
Lampedusa para
Bergoglio, não é uma oportunidade para foto, nem o palco para um exercício de
retórica compassiva.
Lampedusa é a figura programática de um pontificado nascido da urgente necessidade para o catolicismo de uma reviravolta não mais adiável depois do beco sem saída ao qual ele tinha sido levado pela velha configuração do Papa Ratzinger.
Lampedusa é a figura programática de um pontificado nascido da urgente necessidade para o catolicismo de uma reviravolta não mais adiável depois do beco sem saída ao qual ele tinha sido levado pela velha configuração do Papa Ratzinger.
A
Igreja do terceiro milênio deve ser essencial, e dá “nojo” aquele clero que não
se mostra coerente com a sua missão. Dá nojo, expressão tão forte, dirigida por
Francisco aos seminaristas reunidos no Vaticano, antes de partir para
Lampedusa.
A Igreja do terceiro milênio,
tornando ainda mais incisiva a sua doutrina social, desenvolvida ao longo dos
últimos 100 anos, conforme palavras da prefeita de Lampedusa, torna
“visíveis os invisíveis”. Essa Igreja recorda os mortos que tantos se
apressam em arquivar. Ela chama todas as pessoas à corresponsabilidade,
marcando a “globalização da indiferença” e ao mesmo tempo exigindo para que se
aja para “mudar concretamente certas atitudes”.
A Igreja pela qual o Papa Francisco se
consome, a partir da fé, pede
contas aos crentes e a todas as pessoas sobre como exercem a sua
responsabilidade: o que fazem concretamente contra as “novas escravidões”,
contra as múltiplas formas de “exploração”, contra os traficantes de carne
humana, contra aqueles para quem a “pobreza dos outros” é fonte de ganho.”
E
para ser claro, Francisco também pede
contas “daqueles que com as suas decisões em nível mundial criaram situações
que levam a esses dramas”, até a morte de milhões em várias partes do
planeta. Palavras claras, que despedaçam
muitos silêncios hipócritos.
NA HOMILIA, PALAVRAS QUE TOCAM O CORAÇÃO E À CONSCIÊNCIA
A
primeira viagem de Francisco tinha como objetivo
sacudir a consciência de todos perante um gravíssimo problema do século XXI: a
indiferença pelo holocausto do mar”.
Uma
ocasião como essa merecia não apenas gestos à altura, mas também palavras que
tocassem o coração e a consciência.
A
missa celebrada na ilha foi de perdão, mas também foi uma celebração de funeral
de cerca de 25.000 vítimas das chamadas “viagens da esperança”.
Francisco
pergunta:
“Quem chorou
pela morte desses irmãos e irmãs?”
“Quem chorou por essas pessoas que vinham nos barcos? Pelas mães
jovens que traziam os seus filhos? Por esses homens cujo desejo era conseguir
qualquer coisa para sustentar as próprias famílias?”
Francisco foi a Ilha de Lampedusa
justamente com a intenção de “chorar os mortos”, de chorar por aqueles que
ninguém chora.
As palavras iniciais da homilia do
Papa expressam a preocupação central que o incomodava e que estava por trás
desta viagem.
“Li as manchetes dos jornais noticiando naufrágios de barcos lotados
de migrantes fugitivos. E então senti o dever de vir aqui hoje para rezar, para
cumprir um gesto de solidariedade, mas também para despertar as nossas consciências a fim de que não se repita mais o que
aconteceu. Que não se repita, por favor.” –
disse o Papa Francisco.
Ele
apela para um dos frutos nefastos da globalização para encontrar as razões
desta situação.
“Somos uma sociedade que esqueceu a experiência de chorar, de
‘padecer com’: a globalização da indiferença tirou-nos a capacidade
de chorar”
“Habituamo-nos ao
sofrimento do outro, não nos diz respeito, não nos interessa, não é
responsabilidade nossa! E isso porque a globalização da indiferença torna-nos a
todos ‘inominados’, responsáveis sem nome nem rosto”.
Esta
globalização da indiferença nos torna insensíveis em todos os sentidos:
aos clamores da terra e dos pobres.
“Muitos de nós – e neste número me incluo também eu – estamos
desorientados, já não estamos atentos ao mundo em que vivemos, não cuidamos nem
guardamos aquilo que Deus criou para todos, e já não somos capazes sequer de nos
guardar uns aos outros. E, quando esta desorientação atinge as dimensões do
mundo, chega-se a tragédias como aquela que assistimos”,
denuncia Francisco.
“Quem é o responsável pelo sangue destes irmãos e irmãs? Ninguém!
Todos nós respondemos assim: não sou eu, não tenho nada a ver com isso; serão
outros, certamente não eu. Mas Deus pergunta a cada um de nós: ‘Onde está o
sangue do teu irmão que clama até mim?’, reflete o Papa, para
em seguida acrescentar:” Hoje ninguém
no mundo se sente responsável por isto; perdemos o sentido de responsabilidade
fraterna”.
O Papa Francisco pede perdão à Deus
por esse pecado social e estrutural, pela indiferença, por quem se acomodou e
se fechou no seu próprio bem-estar que leva a anestesia do coração. Pede perdão
por aqueles que com poder de decisão a nível mundial, criaram situações que
conduzem a estes dramas.
04 DE OUTUBRO DE 2013
IDA DO FRANCISCO PAPA AO ENCONTRO DO FRANCISCO MENDICANTE
A PEREGRINAÇÃO A ASSIS
Um
papa de nome Francisco leva a Assis em 2013, com o seu nome, seu estilo, o
reconhecimento de que a pobreza se opõe
e cura a idolatria do poder, cura e esmigalha a persuasiva sedução dos meios de
poder.
Em
4 de outubro, Francisco viajou para Assis, no centro da Itália, para uma visita
aos lugares por onde Francisco passou, que foi uma imersão total nos lugares da
espiritualidade franciscana.
Durante
as dez horas que permaneceu na cidade do santo que inspirou o nome de seu
pontificado visitou o santuário do padroeiro da Itália. O Papa Francisco foi o primeiro sucessor de Pedro que entrou e rezou na
“sala da expoliação”, o quarto em que São Francisco se despojou de todos os
seus bens, assim como de todas as tentações mundanas, como sinal de pobreza
evangélica.
FRANCISCO COME COM OS POBRES E NÃO COM AS AUTORIDADES
Ao final da missa,
houveram dois almoços: um no Sacro
Convento de Assis, onde estiveram presentes as autoridades, entre elas o primeiro
ministro italiano, Enrico Letta, e outro no Cáritas de Santa Maria dos Anjos, um centro de acolhida de pobres
da diocese.
Francisco
preferiu comer com os pobres no refeitório do Cáritas ao invés de comer com as
autoridades no Sacro Convento de Assis.
Na escolha da mesa Bergoglio demonstra
do lado de quem está. Com os pobres, os últimos, com os que não possuem nada.
Porque Cristo está ali e em mais nenhum outro lugar.
“Ou se está com os pobres ou com o dinheiro”, disse, pouco antes, durante a
Missa na Praça São Francisco. “Ou comigo ou contra mim”.
A refeição no refeitório da Cáritas
foi um encontro marcado pela espontaneidade, começando pelo abraço, na entrada,
entre o Pontífice e um menino marroquino de sete anos, filho de um dos hóspedes
do centro de acolhida. O menino deu a mão para o Papa e o acompanhou até o
refeitório, no qual estavam 55 hóspedes dos diferentes centros de acolhida da
diocese. Em seguida, sentaram-se juntos
para comer, no canto maior da enorme mesa, na qual Francisco se sentou para
poder ver melhor a todos os convidados.
Após a refeição, Francisco se dirigiu
à Catedral de São Rufino, para se encontrar com o clero.
E voltou a insistir em aspectos indispensáveis: “Como são necessários os conselhos pastorais! Um bispo não pode
conduzir uma diocese sem o conselho pastoral, um pároco não pode consuzir uma
paróquia sem o conselho pastoral.Isto é fundamental!”
“Não tenham medo de sair e ir ao encontro
dos marginalizados” –destacou – “ não se deixem frear por preconceitos, por
costumes, rigidezes mentais ou pastorais, pelo ‘sempre se fez assim’. Porque a
Igreja tem uma missão: “Anunciar até nas periferias”, mas, quais? Não só as
regiões das dioceses que podem ficar à margem, mas também as pessoas,
realidades humanas marginalizadas nos fatos, desprezadas, espiritualmente
distantes.
AS CRÍTICAS À FRANCISCO
QUEM QUER O ESCALPO DE FRANCISCO?
As
resistências e as críticas aos gestos, palavras e atitudes do Papa Francisco
surgiram com o início de seu pontificado. Elas são internas e externas à
Igreja, internas e externas à Cúria romana. Alguns analistas já se perguntam se
Francisco terá forças e os apoios
necessários para avançar em suas reformas, algumas necessárias e urgentes.
Há
uma corrente subterrânea de ataques que brota, se esconde e depois se
reapresenta para sabotar os esforços de reforma de Bergoglio, para retratá-lo
como ingênuo desinformado, para ridicularizá-lo fingindo defendê-lo, em última
análise, para deslegitimá-lo.
Os
setores mais conservadores dentro da
Igreja católica torcem o nariz diante da missa, simples e despojada, celebrada
por Francisco na ilha de Lampedusa.
Na própria Cúria há críticas veladas ao seu jeito de exercer o pontificado. Na opinião destes críticos, Francisco tem que se convencer que é o Papa da Igreja universal – ele desde o primeiro minuto se autodenomina “Bispo de Roma”. Idéia que ele reforça pelo fato de ter se recusado a morar no palácio pontifício e preferir a Casa Santa marta, mais simples e resguardada dos corredores vaticanos. Além disso, pesa sobre ele a pecha de que é fraco teologicamente, porque gosta de improvisar em suas homilias, por exemplo.
Na própria Cúria há críticas veladas ao seu jeito de exercer o pontificado. Na opinião destes críticos, Francisco tem que se convencer que é o Papa da Igreja universal – ele desde o primeiro minuto se autodenomina “Bispo de Roma”. Idéia que ele reforça pelo fato de ter se recusado a morar no palácio pontifício e preferir a Casa Santa marta, mais simples e resguardada dos corredores vaticanos. Além disso, pesa sobre ele a pecha de que é fraco teologicamente, porque gosta de improvisar em suas homilias, por exemplo.
Por mais de três décadas, o Vaticano
dos papas João Paulo II e Bento XVI operou seguindo uma
máxima conservadora: “Sem inimigos para a direita”. Enquanto os teólogos de
esquerda eram silenciados e os bispos liberais a moderados eram postos de lado,
os tradicionalistas litúrgicos e os
conservadores culturais eram diligentemente cortejados e recebiam acesso direto
ao palácio apostólico.
Mas
em poucos meses, o Papa Francisco
inverteu essa dinâmica, perturbando muitos da direita católica ao se
recusar a manter os favoritismos e ignorando os itens preferidos da sua agenda,
enquanto ele ressaltava o tipo de
questões de justiça social que são próximas e caras dos progressistas.
Os
tradicionalistas que se dedicam a rituais da alta Igreja têm ficado
especialmente irritados com o estilo simples – eles diriam simplista – de
Francisco. Desde a eleição de Francisco,
a ansiedade da direita só tem aumentado, enquanto ele continua modelando um
pontificado radicalmente diferente, que prega sobre os males da economia
globalizada, enquanto lembra repetidamente os seus seguidores a cuidar dos
pobres e dos marginalizados.
MARCO
POLITI, NO JORNAL IL FATTO QUOTIDIANO, 10-07-2113 diz que após o abalo
provocado pela viagem a Lampedusa, o tiro ao alvo recomeçou.
A
visita do Papa em Lampedusa foi motivo de duras críticas por parte de políticos
italianos.
FABRIZIO
CICCHITTO, PRESIDENTE DA COMISSÃO DE ASSUNTOS EXTERNOS DA CÂMARA ITALIANA,
reconheceu que o papa “desenvolveu uma reflexão de alto nível”, mas diz, “uma
coisa é a pregação religiosa, outra é a gestão por parte do Estado de um
fenômeno tão difícil. Deve haver uma razoável, não extremista, mas séria e real
autonomia do Estado e da Igreja”.
O VICE-PRESIDENTE
DO SENADO ITALIANO, ROBERTO CALDERONI, por sua vez, disse: ”No estado do
Vaticano, há o rechaço dos criminosos e ilegais por meio da força pública, além
da prisão. A pregação do Santo Padre, foi bonita e tocante, mas as leis são
outra questão, como demonstram as que estão em vigor no Vaticano”.
Ou
seja, rezar não é governar.
GIORDANO
BRUNO GUERRI, NO IL GIORNALE, evoca o risco de que Francisco seja transformado
em “fã dos clandestinos”.
O VATICANISTA
MARCO POLITI disse: “O Papa Francisco
irrita os conservadores obtusos, os prelados briguentos, os cínicos amantes do
poder, por causa da limpeza que ele quer introduzir nos assuntos do Vaticano,
por causa da coerência que ele espera do clero, por causa das críticas aos
bispos-príncipes, por causa da intenção de abolir a monarquia absoluta
católica, fazendo com que os bispos participem no governo da Igreja.”
GIORDANO
FERRARA denunciou-o por “ternura demais”.
MARCELO
VENEZIANI o comparou a uma possível “caricatura”.
MARCO
BERTONCINI, NO JORNAL ITALIA OGGI, o acusou de distorcer o Evangelho, que condenaria
apenas a “riqueza injusta”.
O SOCIÓLOGO GIANFRANCO MORRA o fustigou porque ele não foi ao famoso concerto, definindo toda a sua comunicação com os fiéis como marcada por “arquétipos populistas”.
É
a acusação à qual aderem tantos sites, que o imputam de “populismo, pauperismo,
demagogia”... Sem falar das críticas por ter transgredido os textos litúrgicos,
lavando os pés na Quinta-Feira Santa na prisão Casal di Marmo de mulheres e até
de muçulmanos.
Há
outra série de objeções (mais sutis) ao pontificado de Francisco: a dissociação
entre o discurso e a ação, entre a teologia e a prática.
O HISTORIADOR
EDUARDO HOORNAERT disse: “Até agora, Francisco não fez nenhuma ação decisiva em
uma certa direção, como fez João XXIII, que convocou os cardeais em apenas dois
meses. Vamos descobrir ainda se Francisco não tomou atitudes por prudência ou
falta de coragem. Ainda não consigo dizer qual é o norte que guia Francisco.”
A
JORNALISTA BÁRBARA SPINELLI, em relação à Lampedusa disse: “É como se o Papa dissesse: ”Eu não escrevo
encíclicas, por enquanto. Ou, melhor, proponho uma totalmente nova: fazendo-me testemunha e pastor que não
teoriza, mas age. Eu vou aonde as lágrimas são substância do mundo.”
Estamos aqui relembrando
críticas que ocorreram por volta do mês de julho. Certamente de lá para cá,
Francisco continua deixando em polvorosa os tradicionalistas, os conservadores que
a esta altura já perceberam que Francisco sabe o que quer e o como chegar lá.
Ele estuda cada passo a ser dado na mudança que deseja implementar, e dá cada
um deles com muita prudência e sabedoria.
A POPULARIDADE DO PAPA FRANCISCO
A
popularidade do Papa Francisco talvez se explique pelo fato de que o mundo, hoje, precisa menos de mestres do
que testemunhas.
Um elemento chave da popularidade de
Francisco é sua credibilidade pessoal. Bergoglio é coerente com o evangelho e com a sua própria história
pessoal. Como arcebispo de Buenos Aires vivia em um modesto apartamento de
dois cômodos. Ele mesmo fazia sua comida. Andava de ônibus e metrô. Fugia dos
encontros mundanos. Nunca quis fazer carreira. Por isto, cada vez que invoca a
pobreza para a Igreja e ataca fortemente o desejo das ambições de poder e a
sede de riquezas presentes no âmbito eclesiástico, nenhuma voz se levanta para
criticá-lo. Quem poderia criticar Francisco por pregar uma coisa e fazer o
contrário? Nos lábios do atual papa, a Igreja pobre constitui um paradigma
infalível, em torno do qual consegue um consenso praticamente universal.
O
Papa Francisco fala, tuita, telefona. Boa parte de seu sucesso depende dessa
relação especial com as pessoas. Os seus gestos e suas palavras se tornaram um
aspecto central do pontificado. Bergoglio
transformou o modo de exercer o papado. Ele deu credibilidade a uma
instituição, a Igreja, que corria o risco de ser esmigalhada depois dos
escândalos.
Ele fala e em todas as partes coloca o
centro no Evangelho. Os crentes cercaram a mensagem de Jesus de
um afastamento da vida real. Bergoglio é digno de admiração porque reaproxima
essa mensagem da realidade vivida e sentida pelas pessoas e por isso é
considerado singular.
Ele não é ingênuo. Já se entendeu que
ele tem o seu próprio ritmo em dizer e em calar, quando dizer e quando calar. Traça
um caminho, não há dúvida. Comunicação pura e empatia total com as pessoas. Por
isso, (quase) todos lhe querem bem.
Suas
invectivas, por exemplo, contra a “tirania
invisível” dos centros financeiros internacionais não atacam um objetivo
específico e reconhecível e, portanto, nenhum dos verdadeiros ou supostos
“poderes fortes” se sente efetivamente atacado ou provocado a reagir.
O modo de falar do papa Francisco é provavelmente
um de seus traços mais originais. É simples, compreensível,
comunicativo. Tem a aparência da
improvisação, mas na realidade é cuidadosamente estudado, tanto na invenção
de fórmulas - “pastor com cheiro de ovelhas”, “globalização da indiferença” –
como nos fundamentos da fé cristã que ele mais gosta de repetir e que ele
condensa em um consolador “tudo é graça”, a graça de Deus que sem cessar
perdoa, embora todos continuemos sendo pecadores.
Mas além das coisas ditas há as que
foram deliberadamente caladas. Não é casualidade que não
tenham saído dos lábios de Francisco as palavras aborto, eutanásia e casamento homossexual. O Papa conseguiu se
esquivar delas, parece que decidiu silenciar sobre estes temas que estão
presentes na esfera política de todo Ocidente, inclusive na América Latina,
convencido de que estas intervenções não são da competência do Papa, mas dos
bispos de cada país. Aos italianos disse isso com palavras inequívocas: ”O
diálogo com as instituições políticas é coisa de vocês”. Seu silêncio é outro dos fatores que explicam a benevolência da opinião
pública laica a respeito dele.
Esse
seu modo de agir deixa a todos inquietos. A melhor análise do estilo Bergoglio
é de ALBERTO MELLONI: “Energia calma e incoercível”.
Para
encerrar algumas considerações sobre Francisco, feitas por Sérgio Ricardo Coutinho, mestre e doutorando em História Social e
professor de “História da Igreja” no Instituto São Boaventura entre outros
tantos títulos, no artigo “Igreja e sociedade: o projeto de Francisco”,
publicado na newsletter de 25 de junho
de 2013.
“Francisco
esclareceu seu projeto da seguinte forma:
“uma Igreja que dê testemunho do Reino de
Deus”.
A Igreja,
para ele, não é um movimento político, uma estrutura bem organizada, nem uma
ONG; ela é chamada fundamentalmente a
viver o Evangelho e dar testemunho dele como “sal da terra e luz do mundo”:
é chamada a tornar presente na sociedade o fermento do Reino de Deus; e a faz,
antes de tudo, por meio do seu testemunho: o testemunho do amor fraterno, da
solidariedade, da partilha”.
Francisco chamou a atenção para o fato de
estarmos atravessando uma crise, não só cultural e econômica, mas de uma profunda “crise do homem”, uma
crise antropológica. Por isso, para a Igreja enfrentar esta crise
antropológica, deve sair de si mesma. Ele insiste: “Neste tempo de crise, não podemos preocupar-nos só com nós mesmos,
fecharmo-nos na solidão, no desânimo, numa sensação de impotência face aos
problemas. Não se fechem, por favor!”
Nesta
saída para o mundo, Francisco não demonstra qualquer intencionalidade de
reconstruir a cristandade, onde a Igreja dita regras e valores do viver social.
Seu projeto vai noutra linha: ir ao encontro
do outro, mesmo que diferente de nós. “Porque a fé é um encontro com Jesus, e nós devemos fazer o mesmo que
Jesus: encontrar os outros.
Vivemos numa cultura do desencontro, uma cultura da fragmentação, uma cultura na qual o que não me serve jogo fora, a cultura do descartável.
Nós, pelo contrário, devemos ir ao encontro e devemos criar, com a nossa fé, uma ‘cultura do encontro’, uma cultura da amizade, uma cultura onde encontramos irmãos, onde podemos conversar mesmo com aqueles que pensam diversamente de nós, mesmo com quantos possuem outra crença, que não tem a mesma fé. Todos têm ali em comum conosco: são imagens de Deus, são filhos de Deus. Ir ao encontro de todos, sem negociar a nossa filiação eclesial”
Vivemos numa cultura do desencontro, uma cultura da fragmentação, uma cultura na qual o que não me serve jogo fora, a cultura do descartável.
Nós, pelo contrário, devemos ir ao encontro e devemos criar, com a nossa fé, uma ‘cultura do encontro’, uma cultura da amizade, uma cultura onde encontramos irmãos, onde podemos conversar mesmo com aqueles que pensam diversamente de nós, mesmo com quantos possuem outra crença, que não tem a mesma fé. Todos têm ali em comum conosco: são imagens de Deus, são filhos de Deus. Ir ao encontro de todos, sem negociar a nossa filiação eclesial”
Em nossa próxima postagem vamos abordar a situação do
Catolicismo no Brasil e a visita do Papa Francisco ao Rio de Janeiro por
ocasião da Jornada Mundial da Juventude.
O presente material é fruto de uma pesquisa nas notícias
diárias publicadas pelo Newsletter do IHU - Instituto Humanitas Unisinos.
Agradeço à todos que neste ano prestigiaram “Teologia e
Espiritualidade” com suas visitas. Espero que estejam aproveitando os materiais
por mim disponibilizados, fruto de muitas pesquisas e leituras onde buscamos
aquelas informações que julgamos as mais importantes dentro dos temas
enfocados.
Em 2014 continuaremos com essa agradável tarefa, auto-atribuída,
de divulgar materiais ligados à religião, em especial à cristã, de cunho católico,
na qual fui educada e que determinou o rumo dos meus estudos acadêmicos, sempre
buscando os melhores autores, as melhores fontes, de maneira a fornecer conhecimentos
atualizados e objetivos.
A todos vocês, companheiros de viagem , os meus desejos
sinceros...